No Dia Internacional da Mulher, o coritiba.com.br recebeu o artigo da coxa-branca Marcia Regina Walter, Mestre em Ciências do Esporte UFPR, Professora Especialização em Futebol: Da Iniciação ao Rendimento, da Universidade Tuiuti do Paraná, Psicóloga do Esporte, Vice-Presidente da ABEPEEx (Associação Brasileira de Psicologia do Esporte e do Exercício).
Confira a reflexão e compartilhe:
O PAPEL DA MULHER NO FUTEBOL
*Por Marcia Regina Walter
Há muito tempo as mulheres protagonizam histórias no futebol brasileiro ainda que tenham pouca visibilidade, seja na mídia, no cotidiano dos clubes e associações esportivas, na educação física escolar ou nas políticas públicas de esporte e lazer.
A participação da mulher brasileira no futebol, modalidade esportiva considerada pelo imaginário social, como integrante da identidade nacional, somente aconteceu a partir das primeiras décadas do século XX quando, as mulheres conquistaram maior espaço neste território tido como “essencialmente” masculino.
O criador dos Jogos Olímpicos, o Barão Pierre COUBERTIN, acreditava que a inserção das mulheres no esporte competitivo, em especial nas Olimpíadas, poderia vulgarizar esse ambiente recheado de honras e conquistas. As mulheres foram “autorizadas” a fazer parte deste evento, apenas na sua segunda edição, mesmo sob protesto de alguns de seus idealizadores, cujas intervenções no âmbito da organização das competições, direcionavam-se para que elas apenas assistissem aos jogos e não deles participassem.
A mulher no esporte em geral, é lembrada não por seu desempenho ou conquista, mas pela sua beleza e sexualidade frente ao que a mídia retrata, "o jogo bonito de se ver" não está relacionado ao jogo em si, nem ao aspecto estético das belas jogadas, mas às pernas das jogadoras, às "sainhas e bermudas", enfim, associado a imagem veiculada e vendida pela indústria cultural, determinando padrão de beleza feminina, que confunde a estética do jogo com a estética do corpo ( BRUHNS, 2000).
A profissionalização no Brasil é acentuadamente difícil, visto que não há uma entidade forte que organize o futebol feminino e também não há investimento público nem privado (SUGIMOTO, 2003). Nos EUA, o futebol é visto como esporte feminino, enquanto que em 1994 foi o vice-presidente quem entregou a Taça ao capitão da seleção brasileira, Dunga, e em 1996 foi o próprio Bill Clinton quem entregou a Taça pelo mesmo evento, porém feminino. O que não significa que a mulher é bem mais reconhecida lá do que é aqui nos esportes, frente que a mesma não tem vez no futebol americano e no beisebol, dois dos esportes mais difundidos nos EUA (SUGIMOTO, 2003).
Como o Futebol não é apenas um espaço esportivo, mas também social, os valores da sociedade tiveram um reflexo marcante na constituição da ideia de que futebol não era um espaço feminino. A discussão entre espaços femininos e masculinos vem sendo trabalhada ao longo do tempo, nas mais diversas sociedades. Essa dicotomia sempre existiu, e a própria sociedade, especialmente o meio familiar, até nos dias de hoje, faz com que ainda exista esse tipo de distinção. Este aspecto pode ser reafirmado por um depoimento dado em 2004, pelo então técnico da Seleção Brasileira Feminina de Futebol, Renê Simões. Na véspera da partida final dos Jogos de Atenas, o técnico deu uma declaração a uma emissora de televisão, pedindo desculpas a suas três filhas, por nunca ter lhes dado de presente uma bola de futebol, e por nunca as ter ensinado a jogar.
As mulheres sempre estiveram envolvidas neste esporte, no Brasil, de diversas formas, tanto nos bastidores, como jogadoras amadoras. O esporte, inicialmente, tinha um caráter mais social, pois era um divertimento das elites brasileiras. Fazia parte dos “eventos” de domingo. Capellano (1999) nos mostra que as mulheres tiveram um papel precursor em relação às torcidas de futebol. O termo “torcer” foi incorporado ao futebol brasileiro devido ao modo como as moças das boas famílias se comportavam nestes eventos. Foram as mulheres, aliás, que consagraram a expressão “torcer”.
O futebol praticado por mulheres foi se consolidando no país, com a criação de times femininos e também da Seleção Brasileira Feminina de Futebol, com a geração “Marta”. Mesmo com as conquistas que as “meninas do Brasil” alcançaram o futebol feminino ainda enfrenta muitos problemas. Além da discriminação, há a falta de patrocínio aos times e às jogadoras, em contraste com o futebol masculino.
Segundo a autora Leda Maria da Costa (2007), nunca o termo “futebol é coisa de homem” esteve tão em baixa. Para ela, a mulher como “ser que torce” está se tornando cada vez mais comum em nosso meio, tanto em espaços como as arquibancadas dos estádios, quanto nos espaços virtuais da internet. Ela nos mostra que: “Em grupo ou isoladas, o fato é que as torcedoras de futebol vêm ganhando visibilidade, estimulando, desse modo, novas formas de composição identitária feminina, assim como, criando um público apreciador e consumidor de futebol que traz para esse esporte diferentes demandas e significados”.
Segundo Eriberto Lessa Moura, atualmente para as mulheres brasileiras sua participação ultrapassa o entendimento de que as mesmas tenham apenas um papel de relevância secundária, sendo coadjuvantes, como a mãe que lava os uniformes dos meninos, a irmã que limpa as chuteiras, a namorada que apoia o companheiro. Elas agora se afirmam tendo um papel sócio esportivo no mesmo nível dos homens brasileiros. Não igual, pois o direito à diferença articula um caminho para uma convivência mais saudável entre os sexos e para a construção de um gênero humano que se componha como uma unidade na diversidade.
Mas comemoram o espaço conquistado nas arquibancadas e também dentro dos clubes, em ações sociais e até mesmo nos Conselhos Deliberativos de alguns clubes. Elas fazem parte do corpo técnico como Psicólogas, Assistentes sociais e no meio acadêmico ministram e discutem o Futebol jogado e vivido como identidade nacional.
O dia 8 de março é um marco na luta pelos direitos das mulheres ao redor do mundo. Se fosse possível retroceder no tempo e contar para um cidadão do começo do século 20 que as mulheres, hoje, votam, tem média de escolaridade maior que a dos homens, governam países e estão inseridas amplamente no mercado de trabalho, inclusive no Futebol, talvez fosse impossível de acreditar.
Referências bibliográficas
BRUHNS, Heloisa T. Futebol, Carnaval e Capoeira: Entre as gingas do corpo brasileiro. Campinas - SP: Papirus, 2000.
CARRANO, P. C.R.(org.) Futebol: paixão e política. RJ: DP&A editora, 2000.
CAPPELLANO, Renata. O torcedor de futebol e a imprensa especializada. Juiz de Fora: UFJF, 1999.
DAOLIO, Jocimar. Cultura: Educação Física e Futebol. Campinas - SP. Editora da UNICAMP, 1997.
LESSA, Eriberto. Dissertação de Mestrado. O Estado de São Paulo. Brasil tem 750 jogadoras e a China, 23 milhões. 1996, p. 5.
Revista Veja. Flores do Campo. 1996, p. 72-73.
ROMERO, E. (1994). A educação física a serviço da ideologia sexista. Revista Brasileira de Ciências do Esporte. 15, 3.
SALLES, J. G. C.; SILVA, M.C.P. & COSTA, M.M. (1996). A mulher e o futebol: significados históricos. Em S., Votre (Coord.) A representação social da mulher na Educação Física e no esporte. Rio de Janeiro: Editora Central da UGF.
SUGIMOTO, Luiz. Universidade Estadual de Campinas / Assessoria de Imprensa. Eva Futebol Clube, Campinas: 2003.
No Dia Internacional da Mulher, o coritiba.com.br recebeu o artigo da coxa-branca Marcia Regina Walter, Mestre em Ciências do Esporte UFPR, Professora Especialização em Futebol: Da Iniciação ao Rendimento, da Universidade Tuiuti do Paraná, Psicóloga do Esporte, Vice-Presidente da ABEPEEx (Associação Brasileira de Psicologia do Esporte e do Exercício).
Confira a reflexão e compartilhe:
O PAPEL DA MULHER NO FUTEBOL
*Por Marcia Regina Walter
Há muito tempo as mulheres protagonizam histórias no futebol brasileiro ainda que tenham pouca visibilidade, seja na mídia, no cotidiano dos clubes e associações esportivas, na educação física escolar ou nas políticas públicas de esporte e lazer.
A participação da mulher brasileira no futebol, modalidade esportiva considerada pelo imaginário social, como integrante da identidade nacional, somente aconteceu a partir das primeiras décadas do século XX quando, as mulheres conquistaram maior espaço neste território tido como “essencialmente” masculino.
O criador dos Jogos Olímpicos, o Barão Pierre COUBERTIN, acreditava que a inserção das mulheres no esporte competitivo, em especial nas Olimpíadas, poderia vulgarizar esse ambiente recheado de honras e conquistas. As mulheres foram “autorizadas” a fazer parte deste evento, apenas na sua segunda edição, mesmo sob protesto de alguns de seus idealizadores, cujas intervenções no âmbito da organização das competições, direcionavam-se para que elas apenas assistissem aos jogos e não deles participassem.
A mulher no esporte em geral, é lembrada não por seu desempenho ou conquista, mas pela sua beleza e sexualidade frente ao que a mídia retrata, "o jogo bonito de se ver" não está relacionado ao jogo em si, nem ao aspecto estético das belas jogadas, mas às pernas das jogadoras, às "sainhas e bermudas", enfim, associado a imagem veiculada e vendida pela indústria cultural, determinando padrão de beleza feminina, que confunde a estética do jogo com a estética do corpo ( BRUHNS, 2000).
A profissionalização no Brasil é acentuadamente difícil, visto que não há uma entidade forte que organize o futebol feminino e também não há investimento público nem privado (SUGIMOTO, 2003). Nos EUA, o futebol é visto como esporte feminino, enquanto que em 1994 foi o vice-presidente quem entregou a Taça ao capitão da seleção brasileira, Dunga, e em 1996 foi o próprio Bill Clinton quem entregou a Taça pelo mesmo evento, porém feminino. O que não significa que a mulher é bem mais reconhecida lá do que é aqui nos esportes, frente que a mesma não tem vez no futebol americano e no beisebol, dois dos esportes mais difundidos nos EUA (SUGIMOTO, 2003).
Como o Futebol não é apenas um espaço esportivo, mas também social, os valores da sociedade tiveram um reflexo marcante na constituição da ideia de que futebol não era um espaço feminino. A discussão entre espaços femininos e masculinos vem sendo trabalhada ao longo do tempo, nas mais diversas sociedades. Essa dicotomia sempre existiu, e a própria sociedade, especialmente o meio familiar, até nos dias de hoje, faz com que ainda exista esse tipo de distinção. Este aspecto pode ser reafirmado por um depoimento dado em 2004, pelo então técnico da Seleção Brasileira Feminina de Futebol, Renê Simões. Na véspera da partida final dos Jogos de Atenas, o técnico deu uma declaração a uma emissora de televisão, pedindo desculpas a suas três filhas, por nunca ter lhes dado de presente uma bola de futebol, e por nunca as ter ensinado a jogar.
As mulheres sempre estiveram envolvidas neste esporte, no Brasil, de diversas formas, tanto nos bastidores, como jogadoras amadoras. O esporte, inicialmente, tinha um caráter mais social, pois era um divertimento das elites brasileiras. Fazia parte dos “eventos” de domingo. Capellano (1999) nos mostra que as mulheres tiveram um papel precursor em relação às torcidas de futebol. O termo “torcer” foi incorporado ao futebol brasileiro devido ao modo como as moças das boas famílias se comportavam nestes eventos. Foram as mulheres, aliás, que consagraram a expressão “torcer”.
O futebol praticado por mulheres foi se consolidando no país, com a criação de times femininos e também da Seleção Brasileira Feminina de Futebol, com a geração “Marta”. Mesmo com as conquistas que as “meninas do Brasil” alcançaram o futebol feminino ainda enfrenta muitos problemas. Além da discriminação, há a falta de patrocínio aos times e às jogadoras, em contraste com o futebol masculino.
Segundo a autora Leda Maria da Costa (2007), nunca o termo “futebol é coisa de homem” esteve tão em baixa. Para ela, a mulher como “ser que torce” está se tornando cada vez mais comum em nosso meio, tanto em espaços como as arquibancadas dos estádios, quanto nos espaços virtuais da internet. Ela nos mostra que: “Em grupo ou isoladas, o fato é que as torcedoras de futebol vêm ganhando visibilidade, estimulando, desse modo, novas formas de composição identitária feminina, assim como, criando um público apreciador e consumidor de futebol que traz para esse esporte diferentes demandas e significados”.
Segundo Eriberto Lessa Moura, atualmente para as mulheres brasileiras sua participação ultrapassa o entendimento de que as mesmas tenham apenas um papel de relevância secundária, sendo coadjuvantes, como a mãe que lava os uniformes dos meninos, a irmã que limpa as chuteiras, a namorada que apoia o companheiro. Elas agora se afirmam tendo um papel sócio esportivo no mesmo nível dos homens brasileiros. Não igual, pois o direito à diferença articula um caminho para uma convivência mais saudável entre os sexos e para a construção de um gênero humano que se componha como uma unidade na diversidade.
Mas comemoram o espaço conquistado nas arquibancadas e também dentro dos clubes, em ações sociais e até mesmo nos Conselhos Deliberativos de alguns clubes. Elas fazem parte do corpo técnico como Psicólogas, Assistentes sociais e no meio acadêmico ministram e discutem o Futebol jogado e vivido como identidade nacional.
O dia 8 de março é um marco na luta pelos direitos das mulheres ao redor do mundo. Se fosse possível retroceder no tempo e contar para um cidadão do começo do século 20 que as mulheres, hoje, votam, tem média de escolaridade maior que a dos homens, governam países e estão inseridas amplamente no mercado de trabalho, inclusive no Futebol, talvez fosse impossível de acreditar.
Referências bibliográficas
BRUHNS, Heloisa T. Futebol, Carnaval e Capoeira: Entre as gingas do corpo brasileiro. Campinas - SP: Papirus, 2000.
CARRANO, P. C.R.(org.) Futebol: paixão e política. RJ: DP&A editora, 2000.
CAPPELLANO, Renata. O torcedor de futebol e a imprensa especializada. Juiz de Fora: UFJF, 1999.
DAOLIO, Jocimar. Cultura: Educação Física e Futebol. Campinas - SP. Editora da UNICAMP, 1997.
LESSA, Eriberto. Dissertação de Mestrado. O Estado de São Paulo. Brasil tem 750 jogadoras e a China, 23 milhões. 1996, p. 5.
Revista Veja. Flores do Campo. 1996, p. 72-73.
ROMERO, E. (1994). A educação física a serviço da ideologia sexista. Revista Brasileira de Ciências do Esporte. 15, 3.
SALLES, J. G. C.; SILVA, M.C.P. & COSTA, M.M. (1996). A mulher e o futebol: significados históricos. Em S., Votre (Coord.) A representação social da mulher na Educação Física e no esporte. Rio de Janeiro: Editora Central da UGF.
SUGIMOTO, Luiz. Universidade Estadual de Campinas / Assessoria de Imprensa. Eva Futebol Clube, Campinas: 2003.